sexta-feira, 6 de abril de 2012

ESCOLA NÃO É CLUBE

                                                                                                                                          Benilson Toniolo

Escola é lugar de ensinar, aprender e conviver. De iniciar o exercício da convivência em sociedade, ainda que muitos de nós, na idade adulta, darmos mostras diárias que não fomos, não somos e nem estamos preparados para isso.

Em suma, escola não é clube.

Digo isso por causa de um comentário de um amigo, que falava cheio de enfado sobre as obrigações ao longo do ano que teria na escola dos filhos em determinadas datas do ano. Então, pensei: organizar bailinhos de carnaval, festinhas juninas e de Halloween para os alunos é função da Escola? Resposta: depende.
Sim, penso que depende. Se estas datas forem aproveitadas para chegar a alguns objetivos, tais como: a)promover a convivência pacifica e respeitosa entre indivíduos diferentes; b) estimular o trabalho em equipe; c) gerar conhecimento através de pesquisas sobre as origens da festa e a importância da manutenção de seu significado histórico-cultural –então a resposta é sim, a Escola tem esta função.
Por outro lado, se não houver objetivo algum, e tudo não passar de: a) um tedioso cumprimento de uma obrigação imposta pelo calendário; b) um subterfúgio para que pais frustrados  usem seus pobres filhos para ostentar “poder e influência”; c) estressar ainda mais funcionários e professores desmotivados e mal remunerados –então, meus amigos, a Escola terá perdido uma excelente oportunidade de ficar calada.
Mas o que dizer das ditas festas? Quanto ao Halloween, não é possível falar de uma “comemoração” absolutamente estranha a nós, latinos, e que os mais exaltados classificam como mais uma prova da influência imperialista sobre nós e nossas crianças. Desculpem, mas não há o que dizer sobre uma data cuja razão de existir é desconhecida de grande parte das pessoas que dela tomam parte. Não consigo entender por qual motivo as escolas de ensino fundamental a incluem em sua programação. Deveria ser, quando muito, considerada apenas por escolas de inglês americano. Ponto.
Sobre o Carnaval, há muito se transformou em algo que ainda não sabemos bem o que é. Só digo que é constrangedor  ver meninas de seis anos de fantasias exíguas dançando ao som das “músicas” que se toca hoje em dia. Afinal, já temos mostras mais do que suficientes que erotizar precocemente as crianças costuma produzir resultados trágicos.
Já as festas juninas, coitadas, estas caminham a cada ano de forma resoluta para a definitiva extinção, golpeadas pelas cópias mal acabadas do country americano e dos neocaipiras cibernéticos universitários. Isso sem falar nos pobres Santo Antonio, São Pedro e São João, já quase condenados à irrelevância e ao esquecimento.
E sua Escola, costuma organizar festas como estas para seus alunos? Para quê? Com quais objetivos?
Se for para valorizar e promover a nossa cultura e preservar nossas manifestações artísticas e folclóricas, excelente. Se for apenas para cumprir um calendário e ajudar o comércio local, é melhor procurar logo um clube.
Afinal, Escola é lugar de ensinamento, aprendizado e convivência. O que estiver na contra-mão disso, é perda de tempo e desserviço.

terça-feira, 20 de março de 2012

ESCOLA NÃO É CLUBE

Benilson Toniolo

Escola é lugar de ensinar, aprender e conviver. De iniciar o exercício da convivência em sociedade, ainda que muitos de nós, na idade adulta, darmos mostras diárias que não fomos, não somos e nem estamos preparados para isso.

Em suma, escola não é clube.

Digo isso por causa de um comentário de um amigo, que falava cheio de enfado sobre as obrigações ao longo do ano que teria na escola dos filhos em determinadas datas do ano. Então, pensei: organizar bailinhos de carnaval, festinhas juninas e de Halloween para os alunos é função da Escola? Resposta: depende.
Sim, penso que depende. Se estas datas forem aproveitadas para chegar a alguns objetivos, tais como: a)promover a convivência pacifica e respeitosa entre indivíduos diferentes; b) estimular o trabalho em equipe; c) gerar conhecimento através de pesquisas sobre as origens da festa e a importância da manutenção de seu significado histórico-cultural –então a resposta é sim, a Escola tem esta função.
Por outro lado, se não houver objetivo algum, e tudo não passar de: a) um tedioso cumprimento de uma obrigação imposta pelo calendário; b) um subterfúgio para que pais frustrados  usem seus pobres filhos para ostentar “poder e influência”; c) estressar ainda mais funcionários e professores desmotivados e mal remunerados –então, meus amigos, a Escola terá perdido uma excelente oportunidade de ficar calada.
Mas o que dizer das ditas festas? Quanto ao Halloween, não é possível falar de uma “comemoração” absolutamente estranha a nós, latinos, e que os mais exaltados classificam como mais uma prova da influência imperialista sobre nós e nossas crianças. Desculpem, mas não há o que dizer sobre uma data cuja razão de existir é desconhecida de grande parte das pessoas que dela tomam parte. Não consigo entender por qual motivo as escolas de ensino fundamental a incluem em sua programação. Deveria ser, quando muito, considerada apenas por escolas de inglês americano. Ponto.
Sobre o Carnaval, há muito se transformou em algo que ainda não sabemos bem o que é. Só digo que é constrangedor  ver meninas de seis anos de fantasias exíguas dançando ao som das “músicas” que se toca hoje em dia. Afinal, já temos mostras mais do que suficientes que erotizar precocemente as crianças costuma produzir resultados trágicos.
Já as festas juninas, coitadas, estas caminham a cada ano de forma resoluta para a definitiva extinção, golpeadas pelas cópias mal acabadas do country americano e dos neocaipiras cibernéticos universitários. Isso sem falar nos pobres Santo Antonio, São Pedro e São João, já quase condenados à irrelevância e ao esquecimento.
E sua Escola, costuma organizar festas como estas para seus alunos? Para quê? Com quais objetivos?
Se for para valorizar e promover a nossa cultura e preservar nossas manifestações artísticas e folclóricas, excelente. Se for apenas para cumprir um calendário e ajudar o comércio local, é melhor procurar logo um clube.
Afinal, Escola é lugar de ensinamento, aprendizado e convivência. O que estiver na contra-mão disso, é perda de tempo e desserviço.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

PROFESSORES, ALUNOS E LIVROS

                                                                                                                                        Benilson Toniolo

Alguns amigos costumam dizer que eu gosto muito de ler. Outros, que leio demais. Ambos estão absolutamente… errados. Na verdade, a impressão que tenho é que a vida, para mim, seria impossível sem a leitura. Diariamente, leio no mínimo uma hora. E quando dou por encerrada a leitura de um livro, anoto em diários minhas observações e impressões sobre a obra, antes de iniciar uma nova leitura – hábito também cultivado pelo meu grande amigo, o Pastor Jesus Anacleto Rosa, uma personalidade cada vez mais rara de se encontrar hoje em dia e um homem que me dá generosamente o privilégio de sua valiosa amizade. Chego a copiar trechos inteiros de determinadas obras, de tanto fascínio e inquietação que me provocam. Fazer o quê? Vício é vício.
Meus filhos e minha mulher também são leitores contumazes. De Harry Potter a Érico Veríssimo, em casa lê-se de tudo. A Turma da Mônica, então, é covardia. Tem mais revistinhas do Mauricio de Souza em casa do que, dependendo do dia do mês, comida na geladeira.
Diria que são dois os responsáveis por esta minha, digamos assim, “mania”: um foi meu pai, alagoano servente de pedreiro que se alfabetizou aos vinte e cinco anos de idade para poder realizar seu sonho de tirar carteira de motorista – numa época em que não havia nem mesmo o Mobral. O outro foi a Escola.
Tive a sorte de ter contado, naquela época que nós, os ancestrais, chamávamos de “primário” e, depois “ginásio”, com professores que estimulavam nos alunos não somente o gosto, mas principalmente o prazer pela leitura. Muita gente ainda se lembra da série Vaga-Lume, uma coleção de livros infanto-juvenis que era uma verdadeira febre entre a garotada. Até hoje sei de cor os títulos e as tramas daqueles livros e suas capas coloridas. Não líamos apenas o que os professores determinavam: vasculhávamos as bibliotecas públicas em busca de outros livros da coleção, pedíamos de presente de aniversário a nossos pais, trocávamos, emprestávamos… Tínhamos entre dez e quinze anos, e mal sabíamos que nossos mestres estavam inserindo em cada um de nós uma chama que haveria de durar por toda a vida: a do amor pela leitura e pelos livros.
Hoje, tantos anos depois, continuo a ler, e de forma cada vez mais exigente: se um livro não me instiga, não me cutuca, não me surpreende e nem me provoca, não penso duas vezes: largo. Fiz isto com Nietzsche, recentemente, e seu Zaratustra. Por isso lamento por aquelas pessoas que me dizem que lêem um determinado livro porque ele é “importante”. Um livro deve ser lido somente quando dá prazer, e quando tem a capacidade de transformar o leitor. Se eu sair de uma leitura da mesma forma que entrei, então a única certeza que tenho é que toda a leitura não passou de uma grandiosa e irrecuperável perda de tempo.
Quem lê, pensa. E quem pensa toma para si o seu próprio destino.
Sorte daqueles alunos que tiveram – e que têm, e que terão – professores que farão deles futuros leitores. Sorte daqueles professores que entenderam e levam adiante a tarefa de contribuir para o desenvolvimento intelectual dos seus educandos.

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

A EDUCAÇÃO E O CRESCIMENTO ECONÔMICO DO BRASIL

                                                                                                                                       Benilson Toniolo

O Brasil recebeu, no final do ano passado, o anúncio de que passa a ser a sexta economia do planeta, ultrapassando o Reino Unido, e atrás de Estados Unidos, China, Japão, Alemanha e França, pela ordem. Não é pouca coisa. A notícia, divulgada por uma organização inglesa de pesquisa econômica, serve para confirmar o espantoso crescimento do País em escala internacional, até bem pouco tempo atrás relegado à marginalidade e à irrelevância.
Para exemplificar melhor, basta dizer que recentemente recebemos a visita de representantes do FMI, não para trazer dinheiro, como no passado, mas para solicitar que emprestássemos dinheiro aos países desenvolvidos.
Apesar de as etiquetas das prateleiras dos supermercados teimarem em querer nos mostrar exatamente o contrário, o fato é que o Brasil está, sim, em um momento favorabilíssimo de sua História, do ponto de vista econômico. Daqui pra frente, cabe a nós continuarmos trabalhando, produzindo e colaborando para que esta não seja apenas mais uma efêmera “boa fase”, mas sim, e como parece ser, o cumprimento de nossa sina de ocuparmos definitivamente o lugar de grande nação, mais humana, mais justa e igual.
Mas há vários problemas que podem impedir nosso crescimento. E o mais grave deles diz respeito justamente à Educação. A falta de preparo técnico, o número insuficiente de profissionais qualificados para atender às demandas da alta tecnologia, o altíssimo índice de abandono de cursos e a precariedade verificada na qualidade do ensino básico da rede pública–principalmente nas disciplinas de português e matemática- representam um grande obstáculo para a escalada do crescimento.
Lamentavelmente, entretanto, a tomada de ações que preparem o País para o desafio do crescimento não parece ser prioridade do governo.
Sem que se resolvam os graves problemas que envolvem a Educação, através de um projeto a longo prazo que revitalize o ensino –principalmente o ensino básico- o País não terá como aproveitar a oportunidade que o crescimento econômico proporciona, e mais uma vez verá a caravana do futuro passar sem conseguir subir na carruagem.
Nada melhor que o início de um novo ano, ainda por cima eleitoral, para pensarmos com seriedade no assunto.

domingo, 8 de janeiro de 2012

O INSTITUTO DONA ESCHOLASTICA ROSA

                                                                                                                                    Benilson Toniolo

Permitam-me fazer uso deste espaço para contar uma história. Verídica, ué –senão não seria história.
Em 1984 –o ano, e não o bestseller de George Orwell- eu saía do Ginásio e me preparava para  aquilo que nós, os ancestrais, chamávamos de “Colegial”. Algo muito parecido com o que hoje em dia se convencionou chamar de Ensino Médio.
Pois bem. Mas então eu dizia que me preparava para enfrentar o primeiro grande desafio em minha vida de estudante: prestar o Vestibulinho do Instituto Dona Escholastica Rosa, uma das melhores escolas de Santos, cidade onde nasci. Vinha de uma escola estadual de periferia –o inesquecível  “Coleginho” Santa Rosa, depois EEPG Prof. Emídio José Pinheiro, no Guarujá, onde era querido e conhecido não por todos, mas por uma boa parte dos colegas, para tentar uma vaga numa das únicas escolas técnicas da Baixada, para a qual competiam estudantes vindos de diversas cidades do Litoral. Sem dúvidas, era um desafio e tanto.
A fama do Escholastica era de ser uma escola exigente, difícil, disciplinadora, arraigada às suas tradições, que obrigava muitos estudantes a desistir no meio do caminho, por não suportarem o peso das exigências. Muitos estudos, muitas tarefas, professores preparadíssimos –diversos vinham de longe (como o Prof. José Carlos Mendes Brandão, de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira, que vinha de Bauru, hoje um dos maiores poetas brasileiros contemporâneos), para lecionar naquela Escola, que era sinônimo de qualidade na Educação santista. E a procura por aquela Escola era tão grande que, como eu disse, os pretendentes deveriam prestar uma prova, que denominava-se “ Vestibulinho” para serem matriculados. Era disso que eu estava falando.
Eu estava bem preparado, dentro de minhas possibilidades, e acabei por conquistar um honroso quinto lugar na concorrida prova.
Quando a  notícia se espalhou, no meu pobre bairro, foi um alvoroço. Os colegas vinham à casa para os cumprimentos, as vizinhas parabenizavam minha mãe, na rua, e comecei a me preparar para poder ter o privilégio de freqüentar a respeitada Escola, e ainda mais no período da manhã, onde as aulas eram ainda mais “ puxadas”.
Mas, como diria o famoso Joseph Climber, a vida é uma caixinha de surpresas. Uma doença terrível se abateu sobre meu pai, e tive que arranjar um emprego. Aos quatorze anos, fui trabalhar como office-boy em um escritório de advocacia, no Centro de Santos. Então, como se diz por aí, o caldo entornou: estudava das 07h às 12:35h. Às 13h, tinha que estar no serviço. “Almoçava” um misto frio, geralmente, andando no meio das ruas apinhadas, ou em pé, no ponto de ônibus, e andava o resto do dia, até 19h, quando voltava para casa. Mais de uma hora, para chegar em casa. Até tentei me transferir para o período noturno, mas não teve jeito. Só seria possível no ano seguinte.
Resultado: com uma anemia e com muitos quilos a menos, cheguei ao final do ano com duas matérias em Recuperação: Química e Física. E uma terceira, Matemática, para Conselho de Classe. Precisava de apenas um ponto, nesta disciplina, para poder fazer a Recuperação. Para os mais novos que, na falta do que melhor fazer, me lêem, um esclarecimento: naqueles anos, o aluno só poderia “ficar” em duas matérias. Se ficasse em mais de duas, era reprovado. Ou seja, eu precisava de um mísero ponto, a ser dado pelos meus professores, para ter o direito de ir para a Recuperação e tentar passar de ano.
No dia do Conselho, não deu outra: negaram-me o ponto. Fui reprovado. Repeti.  “Bombei”, como se dizia naquela época.
Ao contrário do que se faz hoje em dia, não fiz nada para extravasar meu ódio –mesmo porque, ódio não havia. Não fui tomar satisfação com ninguém. Não proferi impropérios contra a Direção, não xinguei a mãe de ninguém, não botei o dedo na cara da Secretária, nem mandei que meus pais fossem à escola ameaçar a Diretora com um processo. Ninguém, que eu me lembre, ventilou a possibilidade de me mandar para um psicólogo. Respeitei a decisão do Conselho e me convenci que, no fim das contas, eu não era realmente merecedor de ser aprovado. Minha aprovação seria até um desrespeito aos meus colegas, que se saírem muito melhores do que eu. A decisão da Escola, naquela época, era incontestável. Ponto.
No dia em que soube que tinha sido reprovado, minha maior preocupação era de que forma eu encararia meus pais. Não foi preciso. Assim que abri a porta da casa, desabei num choro doído, soluçado, sofrido, e ambos, pai e mãe, me acolheram num abraço cujo cheiro trago até hoje nas narinas.
No ano seguinte, vida nova: troquei de emprego (o que voltaria a fazer inúmeras outras vezes pela vida), fui estudar à noite e, claro, voltei a ser bom aluno. Formei-me três anos depois em Técnico em Informática (linguagens Basic e Cobol, lembram-se?). Meu pai recuperou-se e viveu ainda por muitos anos, até nos deixar em 2002, quando eu já estava casado, com filhos e morando  nesta Montanha Magnífica, como diz Pedro Paulo Filho, um dos maiores patrimônios intelectuais e históricos que temos neste lugar.
Hoje, ao tomar conhecimento de como andam as coisas nos “Ensinos Médios” por aí, me entristeço. Não por mim, mas por estes moços e moças que jamais saberão o que é lutar pelo direito de estar em uma boa escola. Me entristeço pelos moços e moças que se acham no direito de contestar um Professor, um Diretor, um Conselho de Classe, como contestam seus pais. E que, provavelmente, jamais saberão o que é receber o abraço reconfortante de quem lhe reconhece como você  verdadeiramente é.
Isto, meus amigos, é melhor do que ganhar notas e pontos positivos de presente, ou à força, em disciplinas em que o aluno não move sequer um músculo para aprender, somente para cumprir a obrigação de, simplesmente, passar de ano.

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

CULTURAS DISTINTAS

                                                                                                                               Benilson Toniolo

Caiu-me recentemente nas mãos um texto que gostaria de compartilhar neste espaço. Trata-se de trechos da carta-resposta de um cacique indígena à sugestão, feita pelo Governo do Estado da Virginia (EUA), de que uma tribo de índios enviasse alguns jovens para estudar nas escolas dos brancos:

“(...) Nós estamos convencidos, portanto, de que os senhores desejam o nosso bem e agradecemos de todo o coração. Mas aqueles que são sábios reconhecem que diferentes nações têm concepções diferentes das coisas e, sendo assim, os senhores não ficarão ofendidos ao saber que a vossa idéia de educação não é a mesma que a nossa. (...) Muitos dos nossos bravos guerreiros foram formados nas escolas do Norte e aprenderam toda a vossa ciência. Mas, quando eles voltaram para nós, eram maus corredores, ignorantes da vida da floresta e incapazes de suportar o frio e a fome. Não sabiam caçar, matar o inimigo ou construir uma cabana e falavam nossa língua muito mal. Eles eram, portanto, inúteis. (...) Ficamos extremamente agradecidos pela vossa oferta e, embora não possamos aceitá-la, para mostrar a nossa gratidão, concordamos que os nobres senhores de Virgínia nos enviem alguns de seus jovens, que lhes ensinaremos tudo o que sabemos e faremos deles verdadeiros homens.”

Deixemos de lado o caráter puritano e estereotipado do texto. Afinal de contas, jamais uma cultura vai se sobrepôr à outra, uma vez que todas, ao final, desfragmentam-se e  se fundem em uma única forma de Cultura como característica exclusiva da raça humana. Em outras palavras, cara-pálida: de nada adianta toda a teoria acumulada se, na hora de ver quem corre mais, é o bicho o primeiro a chegar na frente. Da mesma forma, só o conhecimento proporcionado pela convivência acadêmica possibilita uma melhor compreensão do mundo, e ainda é o único caminho para se resolver questões e apontar saídas.
A transmissão do conhecimento, então, deve ser feita considerando-se o respeito pelo outro, pelo que o outro traz de história de vida, de valores que ele cultiva e respeita e das expectativas que ele gera mediante a possibilidade de aprender algo novo, e que passará a fazer parte de sua vida a partir dali.
Para isto, é fundamental que o docente desenvolva a capacidade de exercer sua alteridade, de colocar-se no lugar do aluno, de conhecer sua historia e suas origens, de compartilhar com ele cada etapa do processo evolutivo, de considerar as mesmas dúvidas e questionamentos como possibilidades reais que dêem margem a novas etapas do processo de aprendizado, de insistir sempre, e de vibrar diante da vitória do intelecto humano sobre a treva da ignorância.
Aprendemos com nossos avós que “onde se abre uma escola, se fecha uma cadeia”. Para que esta máxima continue vigorando em nossa sociedade, é imprescindível que as diferenças de cultura e origem sejam respeitadas por quem tem pela frente o desafio de trazer às pessoas a luz do conhecimento.

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

NO TEMPO EM QUE TODOS FALÁVAMOS PORTUGUÊS

Benilson Toniolo

Virou lugar-comum falar mal da educação no Brasil. Como se fosse fácil a tarefa de ensinar em uma sociedade que parece nem saber direito para que lado deve andar. De repente, todos nos convertemos em clones de Paulo Freire, Rubem Alves e Anísio Teixeira, entre outros, com uma diferença: dificilmente alguém propõe algo que melhore o ensino. Em geral, quando se trata de Educação, as pessoas, sabe-se lá por quê, limitam-se a apontar com ferocidade os problemas. Mas e as soluções?
Da minha parte, procuro tomar cuidado com o que digo sobre o tema. Não posso –e nem devo- duvidar da capacidade técnica dos professores, nem da vontade dos alunos em aprender (deve estar lá, em algum lugar), nem tampouco da eficácia dos projetos e programas pedagógicos propostos.
Mas existe algo que me intriga: por que hoje em dia se fala e se escreve tão mal a língua portuguesa? Que somos um país de analfabetos funcionais, é fato, dado que muitos de nós não consegue interpretar um texto primário nem realizar cálculos básicos com as quatro operações. É comum encontrar pessoas que não consegue compreender o que acabou de ler uma, duas, duzentas vezes. Mas o que explica o baixíssimo nível de conhecimento com que estudantes de todos os graus lidam com a língua, ao escrever a falar?
Dizem-me alguns que este é um fenômeno mundial, provocado talvez pela globalização, ou pelo neoliberalismo, ou pelo advento do “internetês”, pelo Google, pelo raio que os parta. A mim, pouco importa: bastam-me as aberrações que ouço e leio diariamente pelas esquinas da cidade. Não preciso saber se as atrocidades lingüísticas são um fenômeno municipal ou universal. Basta-me saber que elas existem, e proliferam aqui, bem debaixo do meu nariz.
Prefiro pensar em algo mais simples: é que a escola, que tão mal ensina a escrever, não mais ensina a falar. Logo, o desenvolvimento da linguagem está entregue à família e ao meio em que a criança vai crescer, ambientes onde dificilmente haverá correções e ajustes enquanto o processo está em pleno curso. Não que isto represente, de todo, um problema, posto que é nestes ambientes que se dá grande parte do aprendizado do indivíduo, inclusive no aspecto cultural –como, aliás, sempre se passou na história da humanidade.
Mas a escola, ao não intervir no processo de edificação da fala e da escrita, contribui para que esta situação se acentue e se agrave, além de abster-se de uma responsabilidade que claramente lhe compete.
O que deveria ser um compromisso básico de qualquer educador, parece ter virado papel exclusivo do professor de Língua Portuguesa, aplicável somente em sala de aula. Se o aluno escreve e fala errado durante as tarefas de Ciências, de História, de Geografia, ou em simples conversas com o professor mesmo fora da sala de aula, não é corrigido, o que significa que vai continuar falando e escrevendo errado.
Conheço muitos líderes de grandes empresas que cometem diariamente verdadeiros assassinatos da língua, e não são corrigidos, porque parece haver um acordo entre nós de que “isto é normal”.
É fácil perceber que a escola não só perdeu a capacidade de ensinar a falar da melhor maneira possível nossa língua, como fala mal ela própria.